“Hey mãe, alguma coisa ficou
pra trás. Antigamente eu sabia exatamente o que fazer... Agora, lá fora, o
mundo todo é uma ilha, a milhas e milhas de qualquer lugar... Hey mãe, eu já
não esquento a cabeça. Durante muito tempo isso era só o que eu podia fazer...
Por isso, mãe, só me acorda quando o sol tiver se posto. Eu não quero ver meu
rosto antes de anoitecer...”
(Engenheiros do Hawaí)
Talvez a lenda de que menstruar é um marco emocional e
ponte para um amadurecimento da mocinha seja real. E foi aos 14 anos que passei
por essa tenebrosa experiência. Tarde demais, mas no meu ponto de vista ainda
podia ter esperado, ou nunca ter vindo.
Aconteceu num domingo, dia dos pais, casa da minha tia
lotada em comemoração. Para variar, o meu pai não estava presente. Eu nem
ligava mais. Conforme vai passando o tempo, a gente se acostuma com tudo, ou
quase tudo. Acho que aconteceu nesse dia como um carma. Mais uma forma de ter
que lembrar dele em um momento importante da minha vida.
Senti que minha vagina estava molhada e sem motivo
aparente. Quem sabe era um daqueles insistentes corrimentos que assombravam a
minha vida. Ainda sem maiores preocupações, fui ao banheiro me limpar.
Na minha calcinha havia umas manchas vermelhas, que se
estenderam até o papel higiênico. Era ela que enfim havia chegado. E como me
trouxe neuroses por ter demorado tanto! Quantas vezes pensei em fingir que
havia descido, só para não me sentir diferente das minhas amigas. Quantas vezes
pensei em usar
Mertiolate para manipular e provar com a calcinha manchada
que estava dizendo a verdade.
Ainda bem que tais pensamentos não se tornaram reais.
Ainda bem que não passava de uma vergonha interna e nunca comentada. Como o
desconforto em ainda não ter pêlos pubianos diante da exaltação das meninas em
se trocar na frente das outras e exibir seus pentelhos fartos. Enquanto eu
ainda parecia uma criança, com a vagina desnuda e rosada. Evitava ao máximo ter
que passar pelo vexame de admitir que apesar de toda aparência física, meu
corpo ainda não tinha se transformado.
Mas agora estava diante de algo que desejava e não sabia
o que fazer. É óbvio que não tinha um absorvente em mãos e por isso precisaria
pedir ajuda a alguém. Mas como sairia daquele banheiro, naquela casa repleta de
gente, sem fazer alarde e encontrar a minha mãe antes que a minha calça
manchasse? Sim, hoje em dia é normal esbravejar que se está menstruada e fazer
conferências sobre as doloridas cólicas e pedir sem hesitação um absorvente
para quem estiver por perto.
Mas era a primeira vez e estava aterrorizada.
Confesso não lembrar perfeitamente dos acontecimentos,
talvez porque os sentimentos fossem mais fortes, mas sei que encontrei a minha
mãe e ela definitivamente piorou a situação. Não sei o que se passou pela sua
cabeça, mas não precisava ter exposto a minha vida assim. Faltou utilizar um
megafone para informar que enfim o seu bebê havia se tornado uma moça. E além
de ter que aprender a andar com um tijolo no meio das pernas, ainda tive que
tentar aparentar naturalidade diante daquela catástrofe e agüentar piadinhas
sem graça pelo resto do dia.
Hoje, eu e a menstruação já temos uma relação amigável,
apesar de não ser uma visita bem vinda e que geralmente vem sem avisar e faz
questão de não ser regulada. Porém, não se demora mais que quatro dias e já
aprendi a conviver com as dores que me causa. Além do quê, tem meses que não
vem e não deixa de ser bem agradável. Inclusive já foi cogitada a hipótese de
ficar sem ela por longos meses, mas se a natureza quis que fosse assim, deixa
que venha.
Eu agüento!
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